por Percival Puggina
Ao observar certas condutas como cidadão não me sai da cabeça a ideia de que a balança da Justiça tem que ser levada para calibrar no Instituto Nacional de Metrologia (Inmetro).
Sou contra fake news. Quando recebo alguma, advirto quem remeteu. Mas não deixa de ser curioso observar que distorções, ocultações, factoides e fake analysis tenham espaço liberado nos grandes grupos de comunicação e não suscitem qualquer preocupação em plena campanha eleitoral. Ao mesmo tempo, as espadas da justiça e as tesouras da censura se exibem afiadas e ameaçadoras para quem conteste “verdades” estatizadas.
Afinal, o que foi o tal “vazamento de sigilo”, que tanto espaço ocupou, tanta matéria proporcionou a ministros do STF, sempre tagarelas quando se trata de afrontar o presidente da República? O que foi a pressão sobre uma suposta exigência de atestado de vacinação de Bolsonaro? O que foi a inteira CPI da Covid, se não um festival de factoides? O que foi o “escândalo” da Covaxin? O que foram as 195 ADPFs com que a oposição fez política usando o STF? O que fez o ministro Fachin ao afirmar que o Brasil vive um populismo autoritário? Quantos outros já saíram da memória, gerados ao longo de três anos?
***
Um amigo me socorre nesta pauta lembrando a reunião do governo ocorrida no dia 22 de abril de 2020. Presentes, Bolsonaro, o general Mourão, o ministro Moro e a equipe do governo. No dizer de Sérgio Moro, o evento teria motivado seu pedido de demissão em aberto antagonismo ao governo.
A saída de Moro foi uma bomba e a notícia de que a reunião estava gravada em vídeo, outra. Com aquela curiosidade que vai ao buraco da fechadura, a mídia entrou em delírio. Todos queriam assistir o vídeo, periciado pela PF e guardado sob sigilo determinado pelo STF. O ex-ministro da Justiça assegurava que o vídeo fazia prova da má intenção do presidente em relação à PF. A mídia militante enlouquecia de curiosidade e a oposição colhia apoios para o pedido de impeachment de Bolsonaro.
A situação rolou durante um mês inteiro até Celso de Mello resolver que a “peça” deveria ser exibida na íntegra. Enfim! Ao liberar a exibição, o ministro ainda botou mais lenha no fogo. Alegou o interesse do material para um eventual processo de impeachment no Congresso e lembrou o precedente da Suprema Corte dos EUA no Caso Watergate durante o governo Nixon. Só essas justificativas já eram condimento suficiente para a voracidade da plateia nacional. Afinal, a República iria cair, como costumam dizer os irresponsáveis.
O vídeo rodou, então, ante os olhos da pátria em vigília! E o factoide se dissolveu no ar. O que restou para a cozinha das redações, que esperava servir filé mignon no noticiário, foi desfiar carne de pescoço.
Por Percival Puggina
Estava imaginando o que passou pela cabeça de um cidadão cubano quando tomou conhecimento da lista de convênios que Lula e sua comitiva assinaram com o governo de seu país na recente visita a Havana, espécie de Jerusalém do comunismo decrépito.
Há alguns anos, época em que muito debati com representantes dos partidos de esquerda, em especial membros de um muito ativo movimento de solidariedade a Cuba, ouvi deles que no Brasil existem miseráveis ainda mais miseráveis do que em Cuba. Eu os contestava dizendo que ninguém desconhecia a pobreza existente aqui, mas era preciso observar uma diferença essencial entre a situação nos dois países. Aqui, os pobres convivem com carências alimentares por falta de meios para adquirir alimentos; em Cuba, mesmo que o povo dispusesse dos meios, não teria o que adquirir porque a economia comunista, como se sabe, é improdutiva.
Esse é um dos motivos, dentre muitos outros, para que ninguém caia na balela de que o comunismo é bom para “acabar com a pobreza”. O que aconteceu com o setor açucareiro dá excelente exemplo. No final dos anos 1960, a URSS se dispôs a comprar 13 milhões de toneladas anuais de açúcar cubano, a partir da safra 1969/1970. O país produzia entre três e quatro milhões de toneladas, com tendência decrescente. Muitas atividades da ilha foram suspensas e comunistas do mundo todo foram trabalhar naqueles canaviais. Conseguiram sete milhões de toneladas.
Trinta anos mais tarde, quando fui a Cuba pela segunda vez, a safra 2002/2003 fora tão escassa que Cuba importava açúcar! Depois, a produção andou pela casa dos dois milhões de toneladas e no ano passado bateu em meio milhão. A história do açúcar é a história da balança comercial e do consequente déficit cambial cubano. Daí o pagamento não em dólares, mas em charutos ou “outras moedas” ... Daí também o motivo pelo qual, se você excluir estrangeiros residentes, turistas, membros da elite partidária e militar, a carência é generalizada.
Imagine então um cidadão cubano sendo informado pelos órgãos de divulgação do estado de que seu país firmara acordo com o Brasil sobre trocas de tecnologia e de cooperação técnica em agricultura, pecuária, agroindústria, soberania e segurança alimentar e nutricional, mudas, bioinsumos e fertilizantes, agricultura de conservação, agricultura urbana e periurbana; produtos alimentares prioritários para consumo humano e animal, reprodução de espécies agroalimentares prioritárias; uso eficiente da água, cadastro e gestão da terra e abastecimento agroalimentar. E mais biotecnologia, bioeconomia, biorrefinarias, biofabricação, energias renováveis, ciências agrárias, clima, sustentabilidade, redes de ensino e pesquisa (*).
Não sei se está previsto, mas se em tudo isso e em outros convênios também firmados, não ligados à produção de alimentos, o Brasil enviar cheque, pode escrever aí: vem charuto.
*Condensado de matéria da Agência Brasil – EBC, íntegra em https://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2023-09/brasil-assina-acordos-de-cooperacao-em-varios-setores-com-cuba.