Por Alex Pipkin
Não há novidade quanto ao fato - observe que fato é algo cuja existência é inquestionável - de que no exercício da performance política sempre se mentiu, por meio do talento e da persuasão de grandes oradores.
Persuadir significa fazer com que alguém se convença de algo, utilizando-se de argumentos válidos e/ou manipulando através de falácias e de mentiras comprovadas.
Porém, na presente era da pós-verdade, a mentira definitivamente não tem pernas curtas.
Se no passado existia a encenação da mentira trajada com o véu da verdade, hoje isso parece ser desnecessário, bastando-se, trivialmente, criar realidades paralelas.
Na atualidade, a falsidade penetra na massa do sangue humano com extrema destreza, auxiliada especialmente pelo fenômeno da disseminação explosiva nas redes sociais, pela hiperpolarização política e o correspondente vírus da dissonância cognitiva.
Tolos isentos de massa crítica praticam intensamente o esporte favorito da propagação da irresponsabilidade e do moderno cancelamento. Ironicamente, quando confrontados com os fatos e as evidências corretas, esses ainda dobram a aposta na falsidade.
A idiotice, a bem da verdade, possui comprovação científica na psicologia humana.
As pessoas passam a acreditar em mentiras e escolhem dados para reforçar e apoiar suas visões destorcidas. A partir daí, elas não se importam se suas “verdades” têm relação com a realidade dos fatos.
O Prêmio Nobel Daniel Kahneman, denomina esse acontecimento como “facilidade cognitiva”, operada por atalhos mentais que servem de influências automáticas, fazendo com que os indivíduos economizem tempo e energia, forçando menos o trabalho cerebral.
Além de não ter pernas curtas, a mentira não tem visão política exclusiva, ocorrendo tanto à esquerda quanto à direita.
Evidente que o sentimentalismo barato em oposição a prudência e a responsabilidade pela apuração da veracidade dos fatos me incomoda, embora, pela lógica da realidade, eu saiba que a mentira continuará reinando de forma protagonista.
Lembro do caso de um homem negro, que foi espancado e morto por dois homens brancos no Carrefour em Porto Alegre. A coloração é importante ser ressaltada. Naquela circunstância, um tsunami de postagens nas redes, incluindo a de um líder religioso, repudiava o racismo, até mesmo o “estrutural”. Na ocasião, comentei que achava fundamental e necessário se aguardar à apuração dos fatos.
Bingo! Após profundas investigações, a polícia conclui, baseado em fatos e evidências, que o racismo só existia nos grupos de indivíduos que fortaleciam as crenças - enganosas - uns dos outros.
Agora o “fantástico” caso do trabalho análogo à escravidão (o que é isso?) na Serra Gaúcha.
Multidões de sinalizadores de virtude ergueram a voz - e outras coisas - para propagandear o precipitado “não tome vinho da Serra Gaúcha”.
Alto lá! A Polícia Federal acaba de informar que não foram encontrados indícios de ligação de vinícolas da Serra ao trabalho análogo à escravidão.
Verdadeiramente, sinto-me com vergonha dos gaúchos que imprudentemente queimaram a foto de vinícolas centenárias, geradoras de emprego, de renda e de riqueza.
Tudo se transformou em política, ou melhor, em oportunismos e politicagens.
O que menos se enxerga são a prudência, a análise do contraditório ao pensamento mágico e o respeito e a coerência isentas de paixões políticas.
Nas redes sociais, câmaras de eco as narrativas nobres e cheias de “boas intenções”, mesmo que os fatos e as evidências comprovem que os sentimentos são distintos da verdade, o coração embriagado de ideologia domina.
Sou realista, essa trágica situação persistirá.
O ambiente macro só fomenta os vícios, e muitas pessoas deixaram o cérebro e o pensamento crítico no armário.
O momento é o de “andar para trás”!
Os “justiceiros sociais” tomaram conta e eles são muitos.
Desse modo, claro, os sentimentos e o lado negro do sentimentalismo sempre superam os fatos, que governam livres, leves e soltos, ou com pouca, mas muito porca resistência.
Triste. Mesmo quando as mentiras são desmascaradas, a verdade verdadeira aparece desbotada.
Por Percival Puggina
Ontem, Dia as Mães, assisti ao vídeo da audiência da Comissão de Comunicação da Câmara dos Deputados na última quinta-feira (aqui). Todo brasileiro deveria, no correr desta semana, tratar de assisti-lo. Isso se tornou imperioso. O vídeo tem pouco mais de três horas que serão usadas de modo importante para o bem de cada um, de sua família e do país. A vida nos colocou neste tempo e neste lugar quando e onde somos testemunhas de dias e de fatos que marcarão de modo indelével nossa existência. Não podemos virar às costas e sair da História, como se fôssemos um Coelho Relojoeiro que jogasse fora seu relógio e se recolhesse entre os sonhos de Alice sobre um país das maravilhas chamado Brasil.
O fato de ser Dia das Mães me aproximou muito do drama e da atitude missionária da principal depoente do evento, Bárbara Destefani (canal “Te atualizei”). Nem de longe dedicaria um cumprimento a qualquer de seus algozes, mas de bom grado viajaria para externar àquela jovem mãe minha profunda admiração. Talento e coragem, senso de humor e seriedade fizeram dela uma figura nacional, sujeita à dupla condição de martírio e assédio.
O silêncio das feministas é um libelo. O silêncio dos senadores sobre o descontrole do STF revira o estômago. O que fazem com Bárbara (que tomo com símbolo de tantos) é a maior evidência de que 1) estamos sob censura no Brasil; 2) a censura vem do topo do Poder Judiciário nacional; 3) tudo mais que se diga sobre o PL 2630 para lhe dar espaço na vitrina das intervenções do Estado é meramente decorativo, acessório. O assunto é censura, sim, num país onde se estabeleceu um poder que não aceita ser contradito. De contrariado, claro, nem se cogita.
Houve um tempo, e já vai longe, em que perante certos tratamentos desiguais, clamava-se contra “dois pesos e duas medidas”. Era o senso popular de justiça. Do mesmo modo, houve um tempo em que punir Chico cidadão comum, mané, pé-de-chinelo, implicava o dever de punir, por iguais motivos, o abonado e influente Francisco, em seus mocassins italianos.
Pois tudo isso ficou para trás, levado na voragem de uma justiça cujos olhos servem a uma visão particular de futuro. Por ser particular, essa visão perde as condições para ser imposta legitimamente a todos. Quais condições? A legitimação dada pelos constituintes à Constituição, pelos legisladores às leis e pelo povo aos parlamentares que elege para representá-lo. Aquele futuro que essa justiça vê (sua compreensão sobre o destino do mundo, da pessoa humana e da sociedade) é apenas um futuro dentre outros possíveis. Perante tal pluralismo, cabe aos parlamentos discernir! Não aos juízes. Não aos ministros. Fora disso, o que se tem é “golpe”, para usar o vocábulo da moda.
Na prática do tempo presente, o pau que bate em Chico só bate em Chico. E não há mais dois pesos e duas medidas. Há apenas um peso e uma singular medida. Ambos servem aos fins de determinada causa, vale dizer, à destruição de uma corrente política e de pensamento dentro da sociedade, cortando suas derradeiras possibilidades de comunicação. Esse prato da balança tem peso zero.